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Mostrando postagens de 2020

Querida Konbini (Konbini Ningen), de Sayaka Murata

Irasshaimasê! Bem-vindo em japonês. Konbini é uma espécie de loja de conveniência japonesa e a autora utiliza esse "não-lugar" como metáfora da vida. Discute o que é ser normal na sociedade, as relações interpessoais e a nossa relação com o trabalho. A personagem principal, Keiko, é a narradora. Ela é uma espécie de caricatura desse não-normal. Possui problemas de sociabilidade, é desprovida de sentimentos, apresenta uma forma muito racional e analítica de funcionar. Quase um robô rodando um programa de como ser "ser humano" (Lembrei dos andróides de Blade Runner!). É alguém que não se adapta ao entorno, não consegue compreender "qual o jeito certo de sorrir, de cumprimentar", de viver. Os outros a consideram estranha, a família entende que ela precisa ser curada, ela não entende qual é a sua doença. Do ponto de vista de Keiko, nos contagiamos com o jeito de ser das pessoas com as quais convivemos, absorvemos seu modo de vestir, de falar, de reagir. E esse

Falar sobre a morte? Uma advertência para a vida...

Talvez por conta da pandemia de COVID-19 e o grande número de mortos no mundo, os últimos livros que li falam sobre o morrer, trazem uma reflexão sobre como nos sentimos quando temos uma doença terminal e sabemos que o tempo de vida que nos resta está acabando. "A morte de Ivan Ilitch" , de Leon Tolstoi, é uma ficção e, como o nome sugere, narra a morte - e também a vida - de um juiz de 45 anos, no século XIX. Em seguida, li "A morte é um dia que vale a pena viver" , de Ana Claudia Quintana Arantes, livro atual que aborda o morrer do ponto de vista de uma médica especialista em Cuidados Paliativos. Ana Claudia trabalha com doentes terminais e observa que o que mais os apavora não é a morte em si, mas a ideia de não ter aproveitado a própria vida, o como vivemos. "E se na verdade toda a minha vida tiver sido errada?" , se questiona Ivan Ilitch.  Falar sobre o fim nos lembra do caminho que percorremos, não é verdade? Não me sinto à vontade para "dar co

Sejamos realistas esperançosos!

Eu costumo dizer que sou uma pessoa otimista, meu copo está sempre meio cheio. Ao longo da vida - hoje tenho 46 anos - essa maneira de viver o dia a dia foi muito confundida com alienação, ingenuidade ou era a menina "que não deve ter problemas", sempre sorrindo. Talvez faça mesmo algum sentido porque, de fato, não acho que preciso ter opinião sobre tudo (alheia por convicção!), acredito no ser humano (" you may say I'm a dreamer" ) e, realmente, não tive grandes dificuldades ao longo da vida. Mas gosto de pensar que sou uma realista esperançosa , no dizer de Ariano Suassuna. Ao longo desses meses, em meio à pandemia do coronavírus, refleti sobre o conceito de espera-nça e seu oposto, o des-espero . Ouvi filósofos e poetas. Para mim, quem tem esperança espera que o Bom, o Belo, o Justo e o Verdadeiro - os ideais platônicos - se sobreponham. Porque é próprio do homem. Confia no insondável, na vida e, principalmente, tem fé em si mesmo . A esperança em que acredi

O Porco Espinho, Le Hérisson

Gostei do filme francês Le Hérisson . A personagem pricipal, Paloma - uma menina de 11 anos, de classe alta, inteligente -, decepcionada com a vida que observa ao seu redor, decide que quando fizer 12 anos irá se matar, pois essa é a única maneira de fugir do destino que a espera. Com uma filmadora velha do pai, vai gravando cenas de sua vida cotidiana, seus olhares. O filme conquista talvez pela sutileza. É mais do que a diferença de classes, a zeladora que não é vista, a vida vazia da classe alta, os 10 anos de terapia-antidepressivos-champagne, a falta de comunicação verdadeira nessa família... é o esconderijo perfeito - um quarto repleto de livros, de mundos que encantam Madame Michel -, é a gentileza e o respeito de um estranho, o desenho e a filmadora de Paloma ajudando-a a significar a vida. "O mais importante não é a morte em si, mas o que você estava fazendo quando ela chegou", é o como se leva a vida que dá sentido à morte e há sempre oportunidade de mudarmos a

Casa arrumada, mente equilibrada

Tudo no Universo tem uma Ordem, não é verdade? A Natureza não é aleatória, o sol não nasce apenas quando está a fim, a lua não deixa de brilhar porque está triste, as estações - primavera, verão, outono, inverno - se sucedem, independente de pandemia, de guerras ou nossos lutos pessoais. E nós, seres humanos, não podíamos ficar de fora dessa Ordem. O Caibalion - estudo da filosofia hermética do antigo Egito e da Grécia - nos ensina que “sempre existe a vibração rítmica de um pólo a outro. O Pêndulo Universal sempre está em movimento. As marés da Vida sobem e descem de acordo com a Lei”, da mesma forma que “há sempre uma ação e uma reação, uma marcha e uma retirada, uma alta e uma baixa, manifestadas em todos os tons e fenômenos do Universo.” A Ordem, portanto, permeia toda nossa vida, nos aspectos físicos, energéticos, emocionais, mentais. "O que está em cima é como o que está embaixo", princípio da correspondência. Se estamos organizados dentro, nossa vida externa será espe

Passarinho Feio ou Pegasus? A escolha é nossa.

A "Lenda do Pégaso" é uma linda canção de Moraes Moreira e Jorge Mautner, que fala de um passarinho feio que não sabia quem era nem a que veio e, então, vivia a sonhar em ser o que não era. Alguém se identifica? Quem de nós pode, de fato, afirmar que se conhece, que age conforme seus princípios e finalidades, sem se deixar levar pelos desejos e opiniões do outro, imune a qualquer tipo de manipulação ou influência? Era uma vez, vejam vocês, um passarinho feio Que não sabia o que era, nem de onde veio Então vivia, vivia a sonhar em ser o que não era Voando, voando com as asas, asas da quimera Sonhava ser uma gaivota porque ela é linda e todo mundo nota Quando Alice - no País das Maravilhas - pergunta ao gato qual o melhor caminho, ele questiona para onde ela deseja ir e ela responde que não sabe, ao que ele retruca: então, qualquer caminho serve. E não é assim? Qual meu propósito de vida? Para que vive Carla Jucá? Como vive? Por que vive? (um professor me fez essas perguntas

Em que momento deixamos de sorver os cheiros e sabores da nossa vida diária?

Por indicação de uma colega, esses dias vi Perfect Sense , traduzido como Sentidos do Amor , direção do inglês David Mackenzie, co-produção da Alemanha, Reino Unido, Suécia e Dinamarca. Nos papeis principais, Ewan McGregor - de Moulin Rouge, Beginners , I Love You Phillip Morris - e a francesa Eva Green, linda! (Não a conhecia...) Grande metáfora para ilustrar o adoecimento da humanidade nos tempos atuais. São 5 os sentidos do corpo humano: olfato, paladar, audição, visão e tato (se não considerarmos o 6o. sentido... a intuição!). Sentimos, internalizamos o mundo e suas "coisas" através dessas capacidades. A vida e seus dias têm cheiros e sabores, sons e imagens, texturas...Nossas relações - intrapsíquicas e interpessoais - são construídas, elaboradas, ancoradas no sorvido pelos nossos sentidos, cada lembrança de dor ou prazer nos remete a um cheiro, um sabor. Cada memória relaciona-se a projeções imagéticas do vivido, desejos de futuro. Tranquilidade? Azul , o m

Homens imprudentemente poéticos, um livro de Valter Hugo Mãe

Contardo Calligaris - Pentimentos

É sempre interessante ler Contardo Calligaris! Lembro que certa época da minha vida, pensei em tornar-me psicóloga. Uma pessoa querida me recomendou, então, a leitura de "Cartas a um jovem terapeuta", de Calligaris. Pronto. Tudo que eu precisava ouvir estava ali. Não casei com a psicologia... : ) No texto abaixo, ele nos faz refletir sobre o processo do viver, as escolhas que (não) fazemos e que determinam a nossa história e de como a tentação da nostalgia do "se" pode nos ludibriar, fazendo-nos questionar o que nos tornamos, os caminhos que trilhamos. Quer saber? Resista à tentação de achar que as "possibilidades" passadas "poderiam ter sido" mais interessantes. O que ficou para trás, não volta mais. Já fez sua escolha? Decidiu ir à praia? Não fique na praia pensando na montanha... vire a página e mergulhe no mar dos seus (des)acertos! "Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é" Caetano Veloso Contardo Calligaris - Pentiment

Mary Poppins e a força da imaginação

Adorei passear pelo mundo mágico de Mary Poppins, onde tudo é possível! Viajar por dentro de um quadro, flutuar de tanto rir, uma vaca dançar, conversarmos com o vento, as estrelas e os animais. E não é um livro apenas para crianças! A própria autora, P.L.Travers, afirmou: "Você não corta um pedaço de sua capacidade de imaginar e produz um livro especificamente para crianças porque - sendo honesto -, na verdade, não dá para saber onde a infância termina e a maturidade começa. É tudo sem final e tudo a mesma coisa.". "Então ela sorriu para o sapato de tal jeito que até o sapato perceberia que o sorriso não era por causa disso." Esse livro é uma inspiração para nos conectarmos com a ideia de que "somos todos feitos da mesma matéria, lembre-se, nós da Selva, vocês da Cidade. A mesma substância nos compõe, a árvore logo acima, a pedra debaixo de nós, a feiura, a beleza. Somos um só, todos rumando para o mesmo final." Também gosto muito

Você tem fome de quê?

Você já reparou que os alimentos ingeridos impactam nosso corpo de maneiras distintas? Que há comidas que "caem bem" e outras nem tanto? É até meio óbvio isso. Da mesma forma, acredita-se que o que consumimos através dos outros sentidos, não apenas o paladar, tem o poder de nos impactar positiva ou negativamente. O tipo de música que ouvimos, os cheiros que nos rodeiam - Maria Bethânia tem um documentário chamado "Música é Perfume" e ela comenta como esses dois elementos são poderosos e conseguem nos afetar instantaneamente! -, os programas que assistimos (quem não já ficou com medo de dormir depois de assistir um filme de terror?rs) e o contato das superfícies com a nossa pele... algo áspero desperta sensações diferentes de uma seda ou um veludo, concordam? Quando estamos nos sentindo com medo e apreensivos, assistir filmes que falam de amor e cuidado e bondade e gentileza aquece nosso coração. Experimente. Estamos vivendo um mundo "covidiano" - isol

Há coisas que dependem de nós e outras não... filosofia na pandemia!

Muito se tem dito sobre essa época que estamos vivendo, acuados em casa por um vírus minúsculo. Digo em relação ao aspecto espiritual da coisa. Que se trata de karma coletivo. Que podemos abrir um portal e dar um salto evolutivo ou retrocedermos e cairmos em um buraco escuro. Que é uma chance de exercitarmos solidariedade e pensarmos mais no outro do que em si mesmo. Até que se trata de uma "faxina" na humanidade e apenas os mais egoístas serão levados, eu já ouvi. Vai saber! Para além do aspecto metafísico, no entanto, vejo que, de fato, se trata de uma oportunidade para estarmos ensimesmados. Sem deslocamentos, sem praia, sem barzinho, sem jantares, sem teatro nem cinema, sem Shopping, sem trânsito para reclamarmos. Sim, talvez o maior desafio dessa quarentena seja justamente a convivência com nosso mundo interior. O estar em silêncio. Sem as muletas externas... teletrabalho, aulas online, lavar pratos, netflix, livros, lavar pratos, youtube, amazon prime, spotify, lav

Sadece Sen - Só você (filme legal no Netflix)

Fazia tempo não assistia uma história de amor tão linda quanto a desse filme turco: Sadece Sen (que significa "só você", em português), lançado em 2014. Uma amiga me recomendou e como eu adoro um romance, fui conferir. Está na Netflix. A diretora é Hakan Yonat, também autora do documentário Ecumenópolis: a cidade sem limites , sobre Istambul em um caminho neoliberal destrutivo (mas essa é outra história!). Sadece Sen nos conta de Ali (Ibrahim Çelikkol) e Hazal (Belçim Bilgin), lindos e turcos (rs). Ali é um ex-pugilista, órfão, de olhos tristes, que vive assombrado com o peso de escolhas - e suas consequências - das quais se arrepende. Já Hazal é uma moça primaveril, bonita e cega que trabalha em um call center, mas que também esconde uma escuridão interna, uma culpa que a aprisiona. Os detalhes vão aparecendo ao longo do filme. Eles se conhecem meio que "por acaso" (será que há acasos na vida?); Hazal costumava ir assistir tv com o tio, que era