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Passarinho Feio ou Pegasus? A escolha é nossa.


A "Lenda do Pégaso" é uma linda canção de Moraes Moreira e Jorge Mautner, que fala de um passarinho feio que não sabia quem era nem a que veio e, então, vivia a sonhar em ser o que não era. Alguém se identifica? Quem de nós pode, de fato, afirmar que se conhece, que age conforme seus princípios e finalidades, sem se deixar levar pelos desejos e opiniões do outro, imune a qualquer tipo de manipulação ou influência?

Era uma vez, vejam vocês, um passarinho feio
Que não sabia o que era, nem de onde veio
Então vivia, vivia a sonhar em ser o que não era
Voando, voando com as asas, asas da quimera
Sonhava ser uma gaivota porque ela é linda e todo mundo nota

Quando Alice - no País das Maravilhas - pergunta ao gato qual o melhor caminho, ele questiona para onde ela deseja ir e ela responde que não sabe, ao que ele retruca: então, qualquer caminho serve. E não é assim? Qual meu propósito de vida? Para que vive Carla Jucá? Como vive? Por que vive? (um professor me fez essas perguntas há mais de 20 anos...), mas lembro de me fazê-las desde que tenho 11 anos, na 5ª série, claro que sem a consciência que hoje possuo.

E naquela de pretensão queria ser um gavião
E quando estava feliz, feliz, ser a misteriosa perdiz
E vejam, então, que vergonha quando quis ser a sagrada cegonha
E com a vontade esparsa sonhava ser uma linda garça
E num instante de desengano queria apenas ser um tucano

Vivemos em um contexto que nos cobra desempenho e protagonismo, todos precisamos ser espetaculares! (Falta plateia para tanto palco). É obrigatório ter um bom emprego, ser capaz de arcar com as próprias despesas, casar, constituir família. As mulheres ainda precisam ser bonitas e magras e saber cozinhar e cuidar da casa. E, dentro da bolha de cada um, há as especificidades - precisamos ler esse e aquele livro, assistir e conhecer o diretor de cinema tal, ser cult ou hipster, vegano também -, ser bom filho, boa amiga, boa companheira, bom funcionário. E, claro, ser ótima em tudo isso e ainda ser FELIZ!

E foi aquele, aquele ti-ti-ti quando quis ser um colibri
Por isso lhe pisaram o calo e aí então cantou de galo
Sonhava com a casa de barro, a do joão-de-barro, e ficava triste
Tão triste assim como tu, querendo ser o sinistro urubu
E quando queria causar estorvo então imitava o sombrio corvo

É fácil se deixar levar pelo que os outros esperam que sejamos e nos perder de nós mesmos. Para agradar, para pertencer, para ter reconhecimento. Pode parecer lugar comum, mas não vejo assim. Precisamos agir no mundo - no nosso mundo inicialmente e depois mais além -, mas cientes de quem somos, quais nossos valores, nossas virtudes, onde queremos chegar, "o que estamos fazendo com a nossa única vida?". Não apenas re-agir, assumindo identidades falsas, superficiais, alheias.

E até hoje ainda se discute se é mesmo verdade que virou abutre
E quando já estava querendo aquela paz dos sabiás
Cansado de viver na sombra, voar, revoar feito a linda pomba
E ao sentir a falta de um grande carinho então cantava feito um canarinho
E assim o passarinho feio quis ser até pombo-correio

Vamos tomar a rédea de ouro em nossas mãos e sermos o herói do nosso destino. Conscientes, lúcidos. "Somos deuses, eis o que somos, embora tenhamos nos esquecido disso". Aproveitemos essa quarentena para mergulhar em nós mesmos, fazer as perguntas necessárias, aquietar para ouvir as respostas... e, sobretudo, ter coragem para sermos tudo aquilo que viemos ser. ;-)

Aí então Deus chegou e disse: Pegue as mágoas
Pegue as mágoas e apague-as, tenha o orgulho das águias
Deus disse ainda: é tudo azul, e o passarinho feio
Virou o cavalo voador, esse tal de Pégaso
Pégaso Pega o Azul


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