O pequeno livro "A Contadora de Filmes" (La Contadora de Películas), do chileno Hernán Rivera Letelier, é uma graça. Eu gostei da história que fala de uma família, cujo núcleo é o cinema e a contação de histórias, pode-se dizer. A mãe abandonou o marido e os filhos, o pai sofreu um acidente e ficou paralítico, as crianças ficam pra lá e pra cá nesse povoado do deserto de Atacama.
E através dos capítulos, da sutileza das entrelinhas, vamos vivendo a magia do cinema - me lembrei de Cinema Paradiso! -, o surgimento da televisão e o impacto que essas mudanças trouxeram para essa comunidade. Ao tempo em que acompanhamos a vida dessa família desestruturada e sem nenhuma perspectiva, onde a filha caçula, a narradora Maria Margarita ou Fada Docine, refaz o caminho da mãe, tornando-se amante de um homem muitos anos mais velho, única alternativa de sobrevivência. Ambas flertam com o mágico, o Belo, talvez um contraponto na dureza dos dias.
E como pano de fundo, presenciamos a decadência da narrativa em favor da televisão e a derrocada de um povo tragado pela ditadura de Pinochet, pela vida nas minas de sal.
"Ou serei uma estátua de sal?
Então, subo até a torre da igreja para contemplar o horizonte. Cada crepúsculo é como a panorâmica final de um velho filme, um filme em tecnicolor e cinemascope - e o ruído do vento batendo nas chapas de zinco é a trilha sonora. Um filme repetido dia após dia. Às vezes triste, às vezes menos triste."
Esse vídeo sobre o livro é bem legal:
A edição da CosacNaify é primorosa, fazendo alusão ao cinema. Os capítulos são curtos e possuem tarjas pretas, lembrando um ecrã. O papel é uma delícia (pólen bold 90g) e a fonte charmosa (Andralis e Knockout). A tradução é de Eric Nepomuceno e a orelha de Walter Salles. E a capa é linda, não é? :-) Se não puder comprar o livro, o pdf da Alfaguara está aqui http://www.identi.li/index.php?topic=263702.
Shakespeare nos disse que somos feitos do mesmo material dos sonhos, pois Fada Docine afirma que somos feitos do mesmo material dos filmes...
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